Memórias com cheirinho de mate
Nasci e cresci aqui mesmo em Canoinhas, a cidade do mate, e tenho visto o quanto a minha querida cidade mudou! Moro no centro há 20 anos, que têm sido a melhor época da minha vida.
Mas nem sempre tudo foi fácil...
O inverno era rigoroso até demais lá pelas 'bandas' de Barra Mansa – o distrito em que morei por muitos anos em minha infância. As árvores de erva-mate ficavam branquinhas, branquinhas quando geava. Toda vez que vou para essa localidade, no interior de Canoinhas, parece que sinto o frio invernal percorrer minha espinha.
Comecei a ajudar meu pai com oito anos de idade, plantando cereais, já que o dinheiro que recebíamos da venda da produção de laranjas e de mimosas não estava dando conta de sustentar uma família com quatorze membros. E, por causa do meu pesado trabalho, chorava baixinho, escondido do pai. Afinal, diziam que homem não podia chorar.
À tarde, ia para a escola, onde quem dava aulas eram professoras estrangeiras, que nem sabiam falar direito o português! Lembro-me de meus amigos rirem escondido até não poderem aguentar mais, por causa do sotaque engraçadíssimo delas. Mas, na sala de aula, quando ouvíamos uma delas tentando explicar alguma coisa em português, segurávamos o riso, já que tudo que fazíamos de errado dava direito a uma palmada – do que eu sentia medo, pois a palmatória castigava nossas mãozinhas trêmulas.
Os passatempos que eu e meus onze irmãos mais gostávamos eram jogar futebol, caçar pobres passarinhos com estilingue, nadar no rio e pescar. Quando nadávamos, podíamos ver os peixinhos se mexendo de tão limpinha que a água era. Diferente de hoje, quando as águas estão quase pretas e sem vida. E havia também um divertimento que me fascinava inteiramente: pegar as folhas do mate e amassá-las com o pilão, até que se tornassem um erva fina. Na verdade, o que me encantava era acompanhar o processo de preparação do mate e depois conferir o resultado: o cheiro, a textura e o sabor...
Domingo era dia de almoçar com o 'opa' e com a 'oma'. Para isso, tínhamos que pegar nossa carroça e preparar os animais. O caminho demorava um pouquinho e, quando nós chegávamos, pedíamos a preciosa benção dos nossos avós, coisa que dificilmente é feita pelas crianças de hoje. Tínhamos muito respeito e admiração por eles.
Já na minha adolescência, passei a ser dono de comércio. Para que meu ganha-pão me sustentasse, buscava produtos em Marcílio Dias e voltava a Barra Mansa. Em uma dessas viagens, comprei meu primeiro carro. Lógico que ele não estava completo, faltava uma coisinha aqui, outra 'acolá'... Mas o que eu mais queria era um rádio para colocar na minha velha e conservada picape. Apesar dos conselhos que meus amigos davam, de que não deveria comprar um rádio, e sim encher meu estabelecimento de mercadorias, decidi seguir meu coração e comprar o rádio. Ah, que alegria senti ao colocar o rádio no 'carrango'! Nesse caso, o valor sentimental valia mais que o real.
Quando tinha trinta anos de idade, construí uma ervateira, da qual eu me orgulho muito! Afinal, a 'bodega' e a lavoura não estavam dando muito lucro. A ervateira acabou contribuindo para o título que pertenceu a Canoinhas por longos anos: 'Capital Mundial da Erva-mate'. A minha modesta e humilde empresa continua funcionando, e neste ano completará trinta anos de funcionamento. Nunca pensei que chegaria a tanto!
O tempo passou voando. Casei, tive filhos e netos. E, agora, meu passatempo preferido é relembrar o passado em que vivi tantas histórias temperadas pelo mate.
O nome do entrevistado é Mário Francisco Dranka, ele tem 61 anos, trabalha como autônomo e mora na cidade de Canoinhas.
Aluna: Letycia Mara Lucas Série: 6ª 1 E. E. B. João José de Souza Cabral
Memórias de um alfaiate
Eu me chamo Vitório Maievski, sou alfaiate conhecido na região, tenho setenta anos e os melhores anos de minha vida foram vividos aqui em Canoinhas.
Na minha infância, eu e meus amigos brincávamos muito com uma espécie de carrinho feito com um carretel de fio e uma ripa de madeira cortada, nada comparado com os brinquedos industrializados de hoje. Eu também andava muito de bicicleta, na única rua calçada que existia em Canoinhas, a Felipe Schmidt. Um dos professores favoritos da minha infância, seu Antônio Costa, era generoso, inteligente e também o único na escola que não dava palmada de palmatória em nossas mãos pequenas e frágeis. Tempos depois, chegou a ser prefeito da cidade.
Naquele tempo, eu e meu irmão costumávamos andar pelo mato. Certo dia, ficamos perdidos e tivemos que dormir lá mesmo. No início me apavorei, mas depois vi que foi uma experiência boa, porque até dormimos, ficamos olhando as estrelas e sentindo aquele delicioso cheiro de natureza.
É claro, tudo isso aconteceu na infância, porque depois cresci, veio a adolescência, e com ela as espinhas e as responsabilidades. Logo em seguida, me apaixonei e me casei.
No dia do casamento, estava chovendo tanto, mas tanto, que minha linda noiva não conseguia sair do carro! Então meu pai teve que sair da igreja e ir buscá-la com um guarda-chuva. Para piorar, quando chegamos em casa, onde seria a festa, estava tudo destruído. Havíamos preparado as mesas e enfeites na varanda, então tivemos que arrumar tudo de volta dentro da nossa simples casa de madeira, com um telhado todo feito de tabuinhas, nada comparado com as telhas de hoje. Mas, mesmo nossa casa sendo humilde, nós conseguimos transformá-la em um lar.
Atrás do Cabral , escola atual, ficava a “Alfaiataria dos Portugueses”. Eu ia lá e ficava observando o dono e os funcionários trabalharem. Isso me inspirou a ter meu próprio negócio, e hoje sou dono da “Alfaiataria Gaúcha”, uma loja que faz parte da história de nossa cidade. Ela significa tanto para mim que, mesmo hoje, estando aposentado, eu ainda volto `a minha velha máquina de costura, trabalho um pouco e fico me lembrando da emoção que senti no dia em que inaugurei a loja.
Lembro-me também que antigamente não existiam muitos carros, apenas carroças e três motos na cidade inteira. Uma era minha e as outras duas de amigos meus, nós éramos “os caras”. Eram motos motos japonesas, vendidas no centro de Canoinhas. No centro, também havia um “bodegão” - mercado que vendia de tudo, desde alimentos até roupas -, se nós quiséssemos um quilo de banha de porco, era só pegarmos uma caneca, enchê-la e acertar com o “bodegueiro”.
Canoinhas é uma cidade pequena,mesmo assim, tive grandes emoções e vivi enormes aventuras aqui.
eu ameeeeei o texto 'Memórias de um alfaiate', muito divertido, legal e empolgante
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